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[OPINIÃO] Desfecho de Cuca no Corinthians é reflexo da sociedade

Técnico renuncia cargo após condenação por crime sexual voltar à tona; caso ocorreu em 1987, na Suíça

Estupro é crime, em 1987 e em 2023. Mas em 87 a população parecia cagar para questões de assédios sexuais e para as causas das mulheres. Hoje cagamos um tiquinho menos. E é esse tiquinho menos que, às vezes, faz com que reparações aconteçam, como no episódio da saída do técnico Cuca do Corinthians, após forte pressão da torcida, da população e da imprensa. Cuca foi condenado pela justiça da Suíça, em 1989, por crime sexual contra uma garota de 13 anos, dois anos antes, quando fazia excursão pela Europa com o elenco do Grêmio. Ele era o camisa 8 do time.

À época, o caso foi tratado pela imprensa como notícia, apenas. Alguns jornais da época publicaram opiniões que colocavam a versão da vítima em dúvida e davam conta de que situações como aquela eram comuns quando times brasileiros viajam para fora. Uma forma de tentar minimizar os fatos. Os anos passaram e o caso foi esmagado por outros assuntos, caindo praticamente em esquecimento, sendo relembrado em 2017 com a quase recontratação que o Santos fazia do ex-jogador Robinho, também condenado por estupro fora do Brasil. A torcida santista, a população e a imprensa, desta vez, pressionaram. O contrato com o jogador não foi efetivado. Mas Cuca assumiu como técnico.

Antes do Santos, Cuca já havia comandado São Paulo, Palmeiras, Atlético Mineiro, Cruzeiro, Fluminense, Botafogo, Flamengo e Goiás, entre outros. Como atleta, além do Grêmio, jogou pela Portuguesa, Santos, Juventude, Internacional e Chapecoense. Tudo isso depois de ter estuprado uma menina de 13 anos e ter sido condenado pelo ato. Nenhuma torcida questionou, nenhum movimento foi realizado e, tampouco, houve empenho da imprensa para voltar no caso ocorrido em 1986. Foi em 2023, agorinha, quando o técnico foi contratado para trabalhar no Corinthians, que parece ter havido uma exploração maior sobre o passado de Cuca.

O que pode fazer sentido para explicar tal reação é justamente a transformação da sociedade, de 1987 até 2023. Os passos foram e têm sido curtos, mas talvez tenhamos caminhado adiante, evoluído um pouco. Resistir a essa transformação, mesmo que sem má intenção – ou sem entender porra nenhuma -, é uma forma de minimizar o ocorrido, como fez uma parcela da imprensa na ocasião, e como continuamos fazendo até pouquíssimo tempo atrás. E o Cuca, nessa história, é só um exemplo daquilo que, hoje, a sociedade não tem mais tolerância.

Por Arilton Batista